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Serra Dourada na mira da Justiça

Por Bruno Félix



Em tempo de grande movimentação em pró da Copa do Mundo em Goiânia, sessenta e oito ex-proprietários estão com uma ação de execução para contestar oferta do Estado de Goiás na desapropriação de terrenos para a construção do Estádio Serra Dourada, que foi iniciada em 1972/1973. A reclamação é que, há cerca de 20 anos, nenhum governante assume a dívida do Estado e os processos se arrastam há 37 anos. Os ex-proprietários querem receber o valor real do terreno – alegam que o governo ofereceu quantias abaixo do valor de mercado.

Apaixonada por futebol e torcedora fanática do Vila Nova, a aposentada goiana Maria Pereira Machado, 95, carinhosamente chamada de dona Fia, é uma dos mais de 200 donos de lotes desapropriados em 1972 para a construção do estádio Serra Dourada no Jardim Goiás, inaugurado em 1975, no governo de Leonino Caiado. Os ex-proprietários dizem que grande parte dos terrenos está sendo pago por meio de precatórias, ou seja, pagamentos parcelados que se arrastam por muitos anos.

A aposentada chegou a Goiânia há 40 anos e passou a investir todo o seu dinheiro na compra de lotes. Ela adquiriu quatro e vendeu três, menos o do Jardim Goiás, porque era o bairro que mais se valorizava na capital. "Quando fiquei sabendo que iriam construir um estádio fiquei muito feliz porque gosto muito de futebol, mas sem dinheiro no bolso", recorda. Até hoje não recebeu um centavo pelo lote. Mas, apesar da morosidade, dona Fia tem esperanças. "Ainda quero gastar o dinheiro em vida". Hoje, ela tem para receber aproximadamente R$300 mil que ela já sabe muito bem como irá gastar. “Quero reformar minha casa e ajudar uma creche”, explica.

Assim como dona Fia, que tem nove filhos, 28 netos e 29 bisnetos, os desapropriados já são idosos e passam da casa dos 70, 80 ou 90 anos de idade. Muitos já morreram deixando para os herdeiros a incumbência de receber o dinheiro. Segundo o juiz de direito responsável pelo caso, Ary Ferreira de Queiroz, da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia, responsável por alguns dos processos, os valores a serem recebidos variam entre R$100 mil e R$1 milhão. Ele informou ainda que apenas um dos 33 processos que ele julgou recebeu todo o valor indenizatório. Outros quatro estão recebendo o dinheiro parcelado e um está esperando o sequestro de verbas públicas em contas bancárias. Os 27 restantes ainda precisam apresentar uma série de documentos e cálculos para iniciarem um acordo. 

Mas por que tanto tempo de processo e morosidade? Ary afirma que a dificuldade em julgar o processo se deve ao fato de existirem muitas partes envolvidas. “Sempre que é feita a avaliação dos imóveis, tanto o Estado quanto os donos não concordam com o que foi apurado, levando a novas diligências, que se prolongam indefinidamente”, explica o juiz, que assegura que deseja pôr fim à pendenga o mais brevemente possível. “Em um processo que se arrasta há 37 anos todo mundo tem culpa: governo, Poder Judiciário, advogados e as partes. Nada justifica um processo parado por tanto tempo”, lamenta. O juiz Avenir Passos de Oliveira cuida das outras ações de desapropriação.

Para o Secretário de Esporte e Lazer da capital, Luiz Carlos Orro, os desapropriados podem discutir judicialmente o preço oferecidos pelos imóveis, mas não a questão da construção do Serra Dourada no local, já que o Poder Público têm o poder de desapropriar qualquer lugar em benefício de obras em prol do estado. Ele pede para que se chegue a um acordo para evitar mais transtornos no caso. "É preciso ter sensibilidade para abreviar qualquer prejuízo para os desapropriados e chegar a uma decisão final sem mais delongas no processo", analisa.

Já para Tales Barreto, ex-administrador do Serra Dourada e presidente da Agel (Agência Goiana de Esporte e Lazer), está havendo uma confusão na discussão do terreno. Segundo ele, a área em discussão não é onde foi construído o estádio, e sim o complexo superior, que envolve o Corpo de Bombeiros, a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego), as margens da BR-153 e onde está sendo construído o Fórum Criminal. Barreto garante que o Serra foi uma ação de compra e venda e que o Estado tem a escritura de compra. "O terreno foi comprado do Lourival Louza (ex-dono do terreno) num valor simbólico. Os desapropriados devem correr atrás do direito deles. Afirmo que o Estado não vai tomar o direito de ninguém", destaca.  

Porém, o advogado Sebastião César Viana, que representa cinco desapropriados dos terrenos do Jardim Goiás, inclusive dona Fia, não nega que um pedaço da área foi vendido por Lourival Louza, mas não foi tudo e boa parte foi desapropriada para a construção do Serra. "O Estado teve interesse nos lotes do setor para iniciar as obras. Afinal, a imissão provisória concedida à construção foi para o Estádio, em desfavor de pessoas no final enumeradas e qualificadas", confirma.

Enquanto isso, dona Fia continuará acompanhando as partidas do Tigre e torcendo para que no final de maio Goiânia seja anunciada como uma das 12 cidades-sede para a Copa do Mundo de 2014 no Brasil. “Quero que a capital seja escolhida porque a cidade dará um passo rápido rumo ao desenvolvimento”, acredita. Entretanto, até lá ela espera ter recebido a quantia que tem direito para ficar apenas na torcida pela seleção brasileira sem ficar indignada com os R$180 milhões que prometem ser investidos no Serra Dourada, afinal, enquanto não lhe pagarem, um pedacinho do estádio é dela. 
 

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